Nova contratada do Tricolor passou por problemas na Ásia, depressão, frustração, mas agora pode realizar um sonho

Nascida na Zona Leste de São Paulo, Glaucia é a mais velha entre 4 irmãos. Seus primeiros gols aconteceram no asfalto, como é bastante comum na história de tantas jogadoras. A escolha por bolas de futebol em vez de bonecas fez a garota deixar a mãe preocupada ao vê-la entre os meninos no meio da rua.

“Minha mãe tinha receio porque o preconceito era grande e eu só ficava na rua. Acordava 7h da manhã pra jogar bola com os meninos e ela não deixava. Mas ela viu que eu gostava, percebeu que não tinha perigo, então apoiou. Era mais uma preocupação, medo do que as pessoas poderiam fazer comigo”, contou.

Onde tudo começou

Na escola, era goleira de handebol, e foi por conta dessa habilidade que em 2007 ela foi ao São Bernardo Futebol Clube fazer um teste. Atraída pelo futebol, pensou que sua carreira seria debaixo das traves, mas se enganou. Seu talento era justamente outro: marcar gols.

Glaucia foi aprovada e rapidamente começou a jogar como titular do time do ABC até 2010. No ano seguinte, a primeira grande chance veio ao defender o Centro Olímpico – um dos melhores times da modalidade. O time era comandado por Arthur Elias e foi vice-campeão paulista naquele ano (perderam a final justamente para o Santos).

]Já com 18 anos, a jogadora mostrou seu cartão de visitas: ao lado de Debinha (sua companheira de time) foi artilheira da competição com 24 gols.

Coréia, lesões e depressão

O bom desempenho da atacante chamou atenção do Jeonbuk, da Coreia do Sul e lá foi Glaucia, aos 19 anos, tentar a carreira fora do Brasil e enfrentar seu primeiro grande desafio na profissão.

“Eu achava que seria bom, só que quando cheguei lá, era muita pressão e eu era muito nova. Claro, a gente tem que lidar com essas coisas, mas eu nunca tinha saído do Brasil, então foi uma mudança muito grande e eu não tinha uma cabeça preparada. Acho que eu conheci o presidente do clube mais do que qualquer pessoa, de tanto que eu pedia pra ir embora. Eu chorava e ele falava que eu tinha que cumprir meu contrato”, revelou Glaucia.

E durante um ano ela sofreu – fisicamente e psicologicamente – as maiores transformações de sua vida.

Eu tive depressão, dormia só duas horas por dia, mudou tudo. Se eu te mostrar uma foto minha daquela época você não acredita que sou eu, eu era fina e muito forte. Ali eu comecei a engordar. Acordava de madrugada, treinava demais, não dormia, tomava remédio e eles não me davam um acompanhamento, não estavam nem aí. E aí eu me machuquei quando estava jogando pela sub-20. Eu era a camisa 9 da seleção quando lesionei a posterior da coxa por excesso de peso e muita coisa foi mudando. Tive que me readaptar com o corpo que eu tinha”, disse a jogadora.

Com o fim do contrato na China, Glaucia voltou ao Brasil em 2013. Jogou a Copa do Brasil pelo Centro Olímpico e depois defendeu o São Caetano durante o Campeonato Paulista. No ano seguinte, foi para o São José, que na época tinha um timaço formado por craques como Rosana, Andressa Alves, Formiga e Poliana.

“Na época, eu estava bem, tinha emagrecido, mas no quarto jogo eu lesionei o ligamento cruzado anterior do joelho e fiquei o ano todo parada”, recordou.

Depois de se recuperar, novamente a Coréia fez uma nova proposta para Glaucia. Foi então a vez do Red Angels contratar a centro-avante e, achando que daria a volta por cima, ela aceitou o desafio. A temporada de 2015 foi apenas regular e, mais uma vez, ela retornou ao Brasil, onde novamente foi para São José e e uma coincidência infeliz, Glaucia teve uma nova lesão de LCA, desta vez no joelho esquerdo, e se afastou dos gramados para se recuperar. 

Em 2017, Glaucia jogou metade do ano pelo Iranduba e outra metade pelo Sport, onde foi campeã estadual.

Pela terceira vez recebeu proposta da Coréia e foi, dessa vez para o KSPO. Agora, a jogadora conseguiu o que tanto esperava.

“Em 2018 fui artilheira do time e terceira maior marcadora da Liga Coreana. Dei a volta por cima que eu queria. Esse clube valeu a pena jogar porque é muito familiar e foi muito bom pra mim”, revelou.

Buscando a melhor forma física e seleção brasileira

Glaucia conta que os comentários sobre o excesso de peso já a incomodaram bastante e que ela também se cobra por uma melhor forma física.

“Para algumas pessoas é fácil (perder peso), mas não é assim. Em 2011 eu era super magra e super forte. E eu entrei em depressão em 2012, no meu primeiro ano na Coréia, eu tinha 19 anos e aí mudou tudo. Meu organismo mudou totalmente e pra voltar ao que eu era, está me custando muita coisa e eu tô atrás, não é por falta de tentar”, contou. “Eu foco muito no que eu estou fazendo hoje para que as coisas aconteçam, o que vai ser amanhã eu já não sei. Mas espero que o que eu esteja fazendo hoje faça com que as pessoas enxerguem meu potencial também”. 

Gláucia tem o sonho de jogar ao lado de Cristiane, mas a atleta do São Paulo ainda não renovou seu contrato. Será que a melhor atacante de 2019 vai conseguir jogar com a atleta que a inspirou?

Fonte: Roberta Nina – UOL
FOTO: Pedro Ernesto Guerra / Santos FC